segunda-feira, 20 de agosto de 2012

OAB apresenta a Armando propostas de reforma do Código Penal‏

Para o senador, é preciso oferecer “à sociedade um novo código para enfrentar um quadro que é grave, com a cidadania amedrontada, escalada da violência e o sistema penitenciário em profunda crise”
O senador Armando Monteiro, único pernambucano a integrar a comissão especial designada a reformar o Código Penal brasileiro, esteve nesta segunda-feira (20) na sede da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/PE), no Recife, para colher sugestões de mudanças necessárias no código.
Tendo em vista a importância da reforma, o presidente da OAB/PE, Henrique Mariano, fez questão de colocar toda a estrutura da Ordem e de uma comissão interna criada especialmente para se dedicar ao tema, em Pernambuco, para auxiliar o senador neste trabalho.
Na ocasião, Henrique Mariano entregou a Armando um documento com propostas iniciais colhidas em audiência pública e nas reuniões da comissão local. "Pernambuco é um celeiro de grandes juristas e criminalistas, por isso criamos essa comissão e agora estamos colocando toda a nossa estrutura à disposição para ajudar o senador. Não há hoje no Congresso Nacional um tema mais relevante do que a reforma do Código Penal", afirmou Henrique Mariano.
"Minha disposição é a de apresentar emendas ao anteprojeto, mas respaldadas no trabalho desenvolvido aqui pela OAB", ressaltou Armando, durante a reunião, que contou com as presenças, além de Henrique Mariano, do presidente da comissão local, Emerson Davis Leonidas Gomes, e de alguns de seus membros: Roque de Brito Alves, jurista de renome internacional; Bóris Trindade; Bruno Frederico de Castro Lacerda; Eliomar de Carvalho Teixeira; e Moacir Veloso.
Logo após a visita à OAB, o senador participou de um debate sobre o assunto no programa de Geraldo Freire, na Rádio Jornal. Veja abaixo os principais pontos abordados por Armando Monteiro:
“Nossa jurisprudência é contraditória”
Armando Monteiro – “Eu considero que o Código Penal é, numa sociedade, algo muito importante, é um código de condutas, e no Brasil a primeira constatação é de que o nosso código é de 1940. Setenta e dois anos já nos separam da edição do código penal anterior. O Brasil era um país diferente, um país eminentemente rural, nós estávamos na época em pleno Estado Novo e a sociedade foi mudando, se transformou em uma sociedade urbana, o Brasil se transformou em um país democrático, um país que consagra esta visão da pluralidade. Veio a constituição de 1988, que se volta mais para a defesa dos chamados direitos sociais e direitos coletivos. Então, é necessário atualizar o código penal brasileiro, aperfeiçoá-lo. E também há um aspecto hoje na realidade brasileira. É que existem mais de 120 leis penais fora do código.
Ou seja, uma legislação dispersa, esparsa, que nos conduz a uma situação de insegurança jurídica. Não há uma organização dos tipos penais adequados. A nossa jurisprudência frequentemente é contraditória. Há uma questão séria ligada à proporcionalidade das penas. Há crimes de baixo teor, de pouca lesividade, que são tratados de forma muito rigorosa, e há crimes gravíssimos que são tratados com penas brandas. Então está na hora de reformar o código. O Senado em boa hora designou uma comissão de juristas notáveis, professores, estudiosos, advogados, operadores do Direito, promotores, procuradores, juízes. Em sete meses, esta comissão ofereceu um anteprojeto, que está agora sob exame desta comissão especial que o Senado criou”.
Nova organização dos tipos penais
Armando Monteiro – “No nosso Código atual, o abandono de animais é tratado com mais rigor do que o abandono de crianças. Então há um quadro que reclama uma nova organização dos tipos penais, uma codificação, uma sistematização, e por isso é que na proposta nova o código fica com um número de artigos maiores, porque você extingue estas leis penais que estão aí de maneira dispersa. Até 53 destas leis modificam o próprio código penal. Então, está na hora de se fazer um trabalho sério, sistematizando, codificando, para que se ofereça à sociedade um novo código de condutas, para enfrentar um quadro que é grave. Nós estamos aí diante da cidadania amedrontada, com escalada da violência, o sistema penitenciário que dá sinais claros de profunda crise. Portanto, é hora de começar, através do código penal, a se oferecer uma contribuição para que a sociedade brasileira possa ver atendida as suas demandas, sobretudo aquelas que são mais urgentes”.
Novos tipos penais: terrorismo, enriquecimento ilícito
Armando Monteiro – “Eu quero destacar ainda que, nesta sociedade que muda, há novos tipos penais. Nós tínhamos, por exemplo, a figura das contravenções. Na infração penal você tinha a contravenção e o crime. Agora, é fundamental que uma coisa seja sinônimo da outra. Então, acaba com a lei das contravenções e verifica-se o que passa a ser crime nas figuras das contravenções. Por exemplo, o jogo de azar, na proposta do anteprojeto se transforma em um crime.
Há o problema do terrorismo. A legislação brasileira não tipifica a questão do terrorismo como crime. O Brasil vai ter eventos internacionais, Olimpíadas, Copa do Mundo, e hoje o nosso ordenamento jurídico não contempla a questão do terrorismo. Há a necessidade ainda de adaptar a legislação aos tratados internacionais de que o Brasil é signatário, por exemplo o tratado de Roma. Essa questão do enriquecimento ilícito é uma figura que passa a ser tratada como tipo penal. Crimes contra a humanidade, uma série de questões que o Brasil precisa ver contempladas no seu ordenamento jurídico”.
A contribuição de Pernambuco
Armando Monteiro – “Então, eu estou convencido de que esta talvez seja a matéria mais importante que está sob exame do Congresso Nacional. E nós vamos trabalhar com prazos razoavelmente curtos. Eu acho que o debate está amadurecido. Esta comissão fez um trabalho notável. Têm mais de três mil sugestões que foram encaminhadas, houve um amplo debate, audiências públicas, etc. E eu quero dizer, como pernambucano, que não sou especialista na matéria, e por isso quero me valer da cultura jurídica de Pernambuco, de todo um acervo que Pernambuco tem. Pernambuco é celeiro de grandes e renomados juristas nesta área de Direito Penal. O saudoso Rui Antunes, Everardo Luna, quantas e quantas figuras, o Roque Brito Alves, que é uma legenda, uma referência internacional.
Então, para apoiar meu trabalho parlamentar, eu recorri logo à Ordem dos Advogados de Pernambuco (OAB-PE), que constituiu uma comissão, que nosso Moacir Veloso integra, e nosso companheiro Marcellus Ugiette também, representando o Ministério Público. Eu quero receber a contribuição dos juristas de Pernambuco, da comunidade jurídica de Pernambuco, para que eu possa, com as minhas limitações, oferecer uma contribuição a este processo”.
A redução da maioridade penal
Armando Monteiro – “Está é uma discussão da maior importância hoje, que está na sociedade, é a questão da maioridade penal. Há hoje, sem nenhuma dúvida, a compreensão de que o jovem tem mais informação, do que tinha na sociedade antiga. Ou seja, o jovem tem todas as informações para ter uma maior consciência dos limites de sua conduta, discernimento. E há também algo muito grave, que é o fato de que a criminalidade hoje está muito associada à questão da droga. E a organização, o negócio da droga se utiliza do adolescente exatamente por conta de que ele não é alcançado. E o que se assiste são os jovens sendo utilizados na chamada indústria da droga, no tráfico. Agora, o que é que eu queria pontuar nesta questão? A comissão de juristas não enfrentou de forma direta esta questão por entender que há uma disposição Constitucional. Alguns entendem como cláusula pétrea. Eu vou me permitir discordar. Eu acho que isto diz respeito à política criminal, a sociedade muda e portanto esta questão pode mudar.  A meu ver não é cláusula pétrea, mas há juristas ilustres que entendem que é. O código consagra uma legislação infraconstitucional. Como há uma disposição constitucional que assegura hoje os 18 anos da maioridade penal, então a proposta do Código não pode alterar. Agora uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) pode alterar isto. E esta questão vai ser discutida.
Agora, uma coisa que me pareceu interessante neste debate, uma sugestão, é que, até que se mude a Constituição – o que pode acontecer não agora, mas em um prazo mais largo -, considerar no Estatuto da Criança e do Adolescente a possibilidade de você adotar penas mais graves, mais rigorosas, para o adolescente que sobretudo reincide, que está associado a crimes hediondos, a crimes de maior potencial de lesividade, etc. Então eu acho que é uma questão que precisa ser encarada. A sociedade hoje tem uma compreensão de que esta questão precisa ser revista”.
Brasil tem penas brandas para homicídios
Armando Monteiro – “Eu acho que nós precisamos de uma legislação mais dura, na minha avaliação, acho que a legislação brasileira tem estas contradições. Quer dizer, você tem delitos comuns, mas é preciso ter cuidado para não consagrar uma situação de incentivo à pratica deste delito. Mas há a questão da desproporção da pena. Com relação ao homicídio eu queria dizer que o Brasil tem uma das legislações mais brandas do mundo. No Brasil ainda há uma figura chamada homicídio simples. Pena mínima, que muitos na hora de defenderem a pena, se pautam pela pena mínima, 06 anos (no Brasil). Há em outros ordenamentos jurídicos (outros países) a pena mínima de 12, 15 anos. Então a legislação brasileira branda. E outra coisa, em alguns ordenamentos jurídicos o crime de homicídio não prescreve. No Brasil prescreve”.
É possível implantar o Código Penal de outros países no Brasil?
Armando Monteiro – “Cada país acumula uma experiência. O código é uma construção humana, não é algo que Deus nos legou. É uma construção humana, que tem relação com nossa vida, a nossa vida cultural, as instituições, o ambiente institucional, e as características da sociedade. Embora o Direito Internacional nos aponte sempre a experiência do chamado Direito Comparado, que nos inspira, e esta comissão de juristas se debruçou sobre vários códigos aí fora. Por exemplo, ao ser mais liberal no tratamento da questão das drogas, sobretudo da perspectiva do consumidor, a comissão fez um exaustivo trabalho. Todos os países da Europa são liberais no tratamento desta questão. Na América do Sul, quase todos são, embora nós tenhamos que nos debruçar um pouco sobre esta questão. Por exemplo, definir a quantidade mínima que o sujeito porta e que caracterizaria o uso para consumo próprio”.
Porte de drogas para consumo próprio
Armando Monteiro – “Nós sabemos que em algumas áreas o traficante carrega sempre uma quantidade muito pequena. Então de repente você poderá, ao liberalizar para o consumo, estar criando proteção para o próprio tráfico. E outra coisa, há uma certa contradição. Na medida em que você incentiva o consumo como pode coibir o tráfico? Então, esta é uma questão sobre a qual a comissão tem que voltar as suas atenções para poder examinar, porque embora seja uma tendência, nós temos ainda que considerar que o Brasil tem índices de violência muito superiores a destes países mais maduros, que liberaram o tratamento do consumo. E sabemos que o uso de droga está muito associado à violência no Brasil. Então eu pergunto: uma sociedade com estas características pode ser tão liberal quanto sociedades mais maduras? Então é este debate que a sociedade precisa fazer e nós estamos lá na comissão com a responsabilidade de interpretar este sentimento”.
Problemas do código de processo penal brasileiro
Armando Monteiro – “Hoje um dos problemas do Brasil é exatamente esta questão do processo. Porque você tem no Brasil um abuso desta questão de processos que permitem as chicanas, a protelação, que de alguma maneira concorrem para este quadro de impunidade que aí está. Então é necessário atualizar toda a parte de processo. E o Senado inclusive já aprovou o novo código de processo que está na Câmara dos Deputados neste momento. É preciso ter um Código Penal e é preciso ter um código de processo penal, que corresponda, que dialogue com este novo arcabouço, este novo ordenamento jurídico que a proposta do novo código consagra”.
Cronograma de trabalho no Senado
Armando Monteiro – “Nós temos um prazo relativamente curto. Até 04 de setembro para apresentar as emendas, mas este prazo vai até 04 de outubro, mais ou menos, porque a partir daí teremos mais 10 dias úteis para a apresentação dos relatórios parciais, mais 05 para a apresentação do relatório geral e, finalmente, mais 05 para apresentação do parecer final da Comissão. Vai agora para as comissões normais, seguir a tramitação, para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), por exemplo.  
Todos os membros desta comissão, ou quase todos, são membros da CCJ, que é uma comissão permanente. Então o trabalho que nós fizermos na comissão especial já vai representar mais de meio caminho andado para que se leve depois a matéria a plenário. Estes prazos, pelo regimento, ainda podem ser dilatados. Agora, há um sentimento na comissão de que a gente tem que concluir o trabalho este ano, de modo a podermos votar este ano. Trabalhamos com este objetivo. E aí o que é que nos anima? É perceber que a sociedade está valorizando este debate, está nos cobrando uma resposta parta estas questões. E também um reconhecimento que eu queria prestar à comissão de juristas que fez um trabalho extraordinário. Em sete meses eles fizeram este anteprojeto”.

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